sexta-feira, 28 de maio de 2010

Cidades invisíveis em cápsulas do tempo



Li ontem que uma das iniciativas do FITEI deste ano é dar o nome de um cidadão anónimo a uma rua da cidade do Porto
. Por instantes, encontrei na realidade urbana do Porto um vislumbre daquela engenhosa e arrojada criatividade que me habituei a admirar nos catalães, mestres na arte de fazer uma cidade respirar através dos pulmões dos que lá vivem.

Exemplo I

Recentemente, perante a contingência de ter de alterar o traçado da carismática Via Diagonal, fizeram o impensável: puseram o assunto à consulta pública. Em vez de se encerrarem em gabinetes camarários produzindo sigilosas cogitações sobre o que poderia vir a ser o futuro da cidade e dos seus cidadãos, deixando cair, aqui e ali, umas misteriosas dicas jornalísticas sobre o que estava a acontecer nos corredores do poder, decidiram perguntar às pessoas o que é que elas queriam.
Um exercício admirável de democracia urbanística: o espaço é público, a decisão também. Criaram um site com duas propostas possíveis de traçado, disponibilizaram informação, construíram cenários com as várias hipóteses. E pediram às pessoas para votar. Não houve economia na polémica, nem fuga da opinião: defensores, detractores, urbanistas, arquitectos e simples cidadãos cruzaram argumentos, criaram campanhas de rua, escreveram-se longas prosas com adjectivos gordos, os jornais abriram-se às réplicas e tréplicas dos comentadores e analistas, uma trepidação cívica invadiu a cidade.

Exemplo II

No momento em que escrevo este texto, os cidadãos de Barcelona estão a escrever mensagens sobre a sua cidade para enviarem para o futuro numa cápsula do tempo que só vai ser aberta em 2159.
Conseguem imaginar? Algures, dentro de século e meio, quanto todos formos passado, numa cidade digna de um delírio de Italo Calvino, os ainda não nascidos habitantes de Barcelona vão saber como é que os seus conterrâneos imaginavam o lugar onde eles então vivem. Magistral projecção de vida, sublime ensaio de imortalidade, a cápsula do tempo do povo de Barcelona é, na verdade, um diálogo intemporal sobre as ficções que uma cidade inspira nos seus habitantes. Sabemos nós amar assim uma cidade?

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