quinta-feira, 29 de abril de 2010

Tudo o que é nacional é opaco


Ouvi há dias na SIC o Costa Ribas contar como os funcionários do fisco norte-americano resolveram um problema com um formulário do IRS que os contribuintes tinham preenchido erradamente: preencheram-no eles e depois enviaram uma carta a cada um dos cidadãos a explicar como se fazia. O objectivo ali, entenda-se, era não privar as pessoas do seu retorno do IRS. O Estado ao serviço dos cidadãos, portanto, exactamente como deve ser.
Penso nisto e olho para os papéis que guardo em casa enviados pelas Finanças, o olho de boi do Estado: leio números, datas e siglas que não entendo e umas palavras com que nunca me cruzo e imagino um especialista em codificação de mensagens a fazer horas extraordinárias na Repartição do meu bairro.
Seja o que for que lá está escrito, o que se lê é um "Venha cá imediatamente!", que me deixa tão perturbada quanto a minha professora primária quando entrava na sala de aula com a Mariazinha na mão - uma rectângulo de madeira maciça que concentrava toda a pedagogia que sabia usar. Era um instrumento cuja finalidade primeira era inspirar culpa mesmo em quem não a tinha e medo sobretudo em quem não o sentia.
O mesmo vale para as cartas das Finanças e toda a sua magnífica opacidade. Não servem para explicar, mas para intimidar. Não convidam ao diálogo, forçam à obediência. Não são avisos amáveis, são ameaças veladas.
O Estado português não sabe falar com os cidadãos e isso, no limite, revela que não é composto por pessoas que pensam como cidadãos.

2 comentários:

  1. Eu reitero aqui uma reclamação já deixada por um outro visitante: Porque demoraste tanto? Porque só agora decidiste partilhar a tua escrita?
    Antes tarde do que nunca. Já não te largarei! Já sou seguidora do anjo sem asas.
    Cump

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  2. ...infelizmente tens toda a razão, e mais: se nem 'nós' conseguimos descodificar as mensagens imagine-se a cara da outra metade da população deste país quando recebem as preciosas cartinhas na caixa do correio. Não admira que neste século as repartições de finanças estejam pejadas de pessoas que não precisam mais do que uma simples informação sobre a informação da informação que já vinha tão bem redigida nas missivas.

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