Li ontem que uma das iniciativas do FITEI deste ano é dar o nome de um cidadão anónimo a uma rua da cidade do Porto. Por instantes, encontrei na realidade urbana do Porto um vislumbre daquela engenhosa e arrojada criatividade que me habituei a admirar nos catalães, mestres na arte de fazer uma cidade respirar através dos pulmões dos que lá vivem.
Exemplo I
Recentemente, perante a contingência de ter de alterar o traçado da carismática Via Diagonal, fizeram o impensável: puseram o assunto à consulta pública. Em vez de se encerrarem em gabinetes camarários produzindo sigilosas cogitações sobre o que poderia vir a ser o futuro da cidade e dos seus cidadãos, deixando cair, aqui e ali, umas misteriosas dicas jornalísticas sobre o que estava a acontecer nos corredores do poder, decidiram perguntar às pessoas o que é que elas queriam.
Um exercício admirável de democracia urbanística: o espaço é público, a decisão também. Criaram um site com duas propostas possíveis de traçado, disponibilizaram informação, construíram cenários com as várias hipóteses. E pediram às pessoas para votar. Não houve economia na polémica, nem fuga da opinião: defensores, detractores, urbanistas, arquitectos e simples cidadãos cruzaram argumentos, criaram campanhas de rua, escreveram-se longas prosas com adjectivos gordos, os jornais abriram-se às réplicas e tréplicas dos comentadores e analistas, uma trepidação cívica invadiu a cidade.
Exemplo II
No momento em que escrevo este texto, os cidadãos de Barcelona estão a escrever mensagens sobre a sua cidade para enviarem para o futuro numa cápsula do tempo que só vai ser aberta em 2159.
Conseguem imaginar? Algures, dentro de século e meio, quanto todos formos passado, numa cidade digna de um delírio de Italo Calvino, os ainda não nascidos habitantes de Barcelona vão saber como é que os seus conterrâneos imaginavam o lugar onde eles então vivem. Magistral projecção de vida, sublime ensaio de imortalidade, a cápsula do tempo do povo de Barcelona é, na verdade, um diálogo intemporal sobre as ficções que uma cidade inspira nos seus habitantes. Sabemos nós amar assim uma cidade?
Foto fantástica! :)
ResponderEliminarQuase tão boa quanto o teu blog